ONU Mulheres recebe a decisão do STF que declara a inconstitucionalidade do argumento da Legítima Defesa da Honra como importante passo para a efetivação dos direitos humanos das mulheres
03.08.2023
Em 1º de agosto de 2023, mês em que se comemoram os 17 anos da Lei Maria da Penha, o Supremo Tribunal Federal (STF), em votação unânime de seus Ministros e Ministras nos autos da ADPF 779, declarou a inconstitucionalidade do argumento da legítima defesa da honra aplicado aos crimes de feminicídio. A decisão veda que a tese seja empregada por profissionais do sistema de justiça ou autoridades policiais. A ONU Mulheres junta-se à sociedade brasileira para celebrar o posicionamento da Corte, que sinaliza avanços nas respostas do Estado a essa grave violação de direitos humanos das mulheres. De acordo com o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2022 observou-se aumento dos casos de feminicídio (1.437 casos registrados, crescimento de 6,1%) e tentativa de feminicídio (2.563 casos registrados, aumento de 16,9%). 61,1% das vítimas de feminicídio no país são negras e sete a cada 10 foram mortas dentro de casa.
A decisão da corte constitucional possui caráter histórico. A legítima defesa da honra ganhou espaço nos tribunais brasileiros como tese jurídica utilizada para absolver ou atenuar penas para feminicidas. O argumento foi forjado a partir de valores morais da sociedade patriarcal, valendo-se da desigualdade estrutural de poder entre homens e mulheres, da naturalização da violência contra as mulheres, especialmente no ambiente doméstico e familiar, e da baixa representação de mulheres nos espaços de tomada de decisão, como o Judiciário.
Nos anos de 1980, as mobilizações de movimentos feministas e de mulheres expuseram para a sociedade brasileira como o argumento contribuía para a impunidade e criava obstáculos ao acesso à justiça. A tese reforçava concepções conservadores sobre o casamento como vínculo que sobrepunha a vida das mulheres a noções patriarcais de honra masculina, perpetuando normas sociais danosas às mulheres. A edição de novas legislações, como a n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) e n. 13.104/2015 (Lei do Feminicídio), contribuíram para mudanças na sociedade e no sistema de justiça, no sentido de buscar respostas melhores e mais efetivas para a proteção dos direitos humanos das mulheres. Ainda assim, o uso da legítima defesa da honra seguia sendo importante obstáculo para responsabilizar autores e garantir o acesso à justiça, conforme observado nas “Diretrizes nacionais para investigar, processar e julgar com perspectiva de gênero as mortes violentas das mulheres”, desenvolvidas pela ONU Mulheres e pelo governo federal em 2016.
Quarenta anos após as primeiras denúncias pelos movimentos feministas e de mulheres, a decisão do STF emite uma mensagem importante de tolerância zero à violência de gênero contra as mulheres e coloca fim ao uso do argumento atentatório aos direitos das mulheres. A decisão contribui para realinhar a atuação dos órgãos do sistema de justiça e da segurança pública aos preceitos constitucionais para construção de uma sociedade com igualdade de gênero, direitos humanos e dignidade para todas as pessoas. Ela retoma também as obrigações legais contraídas pelo Estado Brasileiro com a ratificação da Convenção pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará).
A ONU Mulheres celebra a decisão histórica do STF e reforça o compromisso de seguir cooperando com o Estado brasileiro para a construção de leis, políticas e ações de prevenção e resposta a todas as formas de violência de gênero contra as mulheres em sua diversidade: para evitar os feminicídios, garantir-lhes o acesso à justiça com perspectiva de gênero e promover o direito das meninas e mulheres a uma vida livre de violência.
Sobre a ONU Mulheres
ONU Mulheres é a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e Empoderamento das Mulheres. Presentes no Brasil desde 1992, como UNIFEM, e desde 2012 como ONU Mulheres, o nosso Programa de País é implementado com atenção à proteção dos direitos humanos e empoderamento das meninas e mulheres enfrentando formas de discriminação baseadas em gênero, raça, etnia e outros fatores, conforme definidos e alinhados às prioridades nacionais.
Mais informações sobre os nossos programas e resultados no país podem ser encontrados no Portal de Transparência da ONU Mulheres.