No Dia Internacional das Mulheres, voo com 35 venezuelanas chama a atenção para a integração socioeconômica de refugiadas e migrantes no Brasil
08.03.2023
Por meio da Operação Acolhida, venezuelanas saíram de Roraima com vaga de emprego sinalizada em empresas de São Paulo e Santa Catarina
Uma ação liderada pela Operação Acolhida e apoiada por organizações da sociedade civil e agências da ONU atuantes em Roraima chamou a atenção para a necessidade e a importância da integração socioeconômica de mulheres refugiadas e migrantes no Brasil. Realizado simbolicamente no dia 8 de março, Dia Internacional das Mulheres, o voo de interiorização levou somente passageiras, todas mulheres venezuelanas que seguiram para São Paulo e Santa Catarina com uma vaga de emprego sinalizada.
O voo com destino à Chapecó (SC) e escala em Guarulhos (SP) foi uma iniciativa coordenada pelo Governo Federal em parceria com as Forças Armadas, agências da ONU, organizações da sociedade civil, organismos internacionais, além de entidades privadas, órgãos dos poderes executivo, legislativo e judiciário e entes federativos. Em fevereiro, as ações de interiorização alcançaram a marca de quase 97 mil pessoas interiorizadas, sendo 42.721 mulheres (44% do total).
Para Dariannis, 25 anos, a oportunidade de interiorização é um recomeço. “Estou super emocionada por esta viagem e pela oportunidade que nos estão dando de um novo futuro. Essa é minha maneira de começar, é um pequeno passo para grandes metas. Agora espero trazer a minha família, tê-la junto comigo, e dar um futuro para a minha filha”, afirmou enquanto embarcava.
Há um ano no Brasil, Soriet, de 41 anos, espera que a ação chame a atenção de empresas para que mais oportunidades sejam oferecidas. “Espero que em São Paulo eu tenha uma melhor qualidade de vida, já que tenho agora um bom emprego. Espero que tudo saia bem. Hoje é o Dia Internacional das Mulheres, e isso é algo maravilhoso, que vai abrir muitas portas a mulheres migrantes venezuelanas”, declarou.
“O Voo deste 8 de março será um marco importante de uma operação que envolve várias áreas dos Três Poderes, estados e municípios, civis e militares, entidades e organizações internacionais ligadas à ONU, numa aeronave da Força Aérea Brasileira, transportando exclusivamente venezuelanas, representando o trabalho de tantas pessoas e, especialmente, das mulheres”, celebrou Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome.
A Operação se estrutura em torno de três eixos: ordenamento de fronteira; acolhimento; e interiorização. Pelo último eixo, há a modalidade Vaga de Emprego Sinalizada (VES), situação das passageiras do Voo desta quarta-feira, que terão a oportunidade de trabalhar em empresas do interior de Santa Catarina e São Paulo.
“No cuidado com pessoas migrantes e refugiadas, que chegam de outros países ao Brasil, tem o complexo momento da acolhida, na chegada. Mas, digo que o maior desafio é a interiorização. Em qual lugar do Brasil esta pessoa ou família ou várias famílias serão recebidas, o apoio, a oportunidade de trabalho, a moradia, a superação da barreira da língua, são muitos desafios que a Operação Acolhida tem que lidar”, prosseguiu o ministro Wellington Dias.
Em cinco anos, os municípios que mais receberam pessoas migrantes e refugiadas foram, na ordem: Curitiba (PR), com 2.927 interiorizações; São Paulo (SP), com 2.038; Chapecó (SC), com 1.777; Dourados (MS), com 1.608; e Manaus (AM), com 1.384.
“Mulheres e meninas migrantes estão quebrando estereótipos, criando soluções inovadoras e contribuindo ao desenvolvimento de suas comunidades de acolhida”, destacou Carla Lorenzi, coordenadora de integração socioeconômica d Agência da ONU para as Migrações (OIM), que apoia todas as etapas da interiorização, incluindo revisão de documentos, contatos com familiares, identificação dos casos de proteção, compra de passagens aéreas e acompanhamento até o destino final dos venezuelanos e venezuelanas interiorizadas.
O voo de 8 de março levou as mulheres para as duas regiões que mais acolhem as venezuelanas: o Sul, com 55% do total e a Sudeste, com 21%. “A OIM está empenhada na inclusão socioeconômica das mulheres venezuelanas migrantes e de outras nacionalidades em conjunto com o governo brasileiro. Este voo que leva 35 venezuelanas empregadas em diferentes municípios brasileiros é emblemático desse objetivo que buscamos realizar e é um passo a mais em direção à redução da desigualdade de gênero”, completou Carla Lorenzi.
Thaís Menezes, oficial de Relações Institucionais da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) explicou a importância de estratégias de interiorização que atentem às vulnerabilidades das mulheres nesse contexto. “A atual iniciativa concretiza um princípio-chave para o ACNUR de ‘não deixar ninguém para trás’, ou seja, de considerar as necessidades específicas de grupos com os quais trabalhamos, superando desafios e fomentando para que tenham acesso de fato aos direitos e aos serviços que lhe são garantidos pela legislação”.
Integração socioeconômica: Do total de 42.721 mulheres interiorizadas desde abril de 2018, 61% (25.855) têm mais de 18 anos. Delas, 8% foram interiorizadas na modalidade VES (vaga de emprego sinalizada). Niusarete Lima, coordenadora do Subcomitê Federal para Acolhimento e Interiorização de Imigrantes em Situação de Vulnerabilidade e gestora de projetos do MDS, explica que um dos grandes desafios da Operação Acolhida ainda é a oferta de vagas de emprego para mulheres.
“Embora saibamos que muitas dessas imigrantes que aqui chegam, têm grande potencial para contribuir com o nosso país, a oferta para as mulheres, principalmente com filhos, ainda é desafiadora. Neste 8 de março, esperamos que portas se abram no mercado de trabalho para que elas exerçam os seus direitos de poder cuidar da família, dos filhos e seguirem adiante”, ponderou.
De acordo com a pesquisa Oportunidades e desafios à integração local de pessoas de origem venezuelana interiorizadas no Brasil durante a pandemia de Covid-19, divulgada em 2022 por ONU Mulheres, ACNUR e Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), homens venezuelanos refugiados e migrantes em Roraima têm quase três vezes mais chances que as mulheres de conseguirem ser interiorizados para outros estados do Brasil já com vaga de emprego sinalizada, embora elas tenham maior escolaridade. A pesquisa também indica que, depois da interiorização, a subutilização da força de trabalho das mulheres é 3,5 vezes maior que a dos homens – 41,3% contra 11,8%, respectivamente.
As mulheres têm sofrido mais com a informalidade, ainda de acordo com a pesquisa: enquanto 29,4% dos homens interiorizados trabalham de maneira informal, o índice é de 37,3% entre elas. E, quando as mulheres conseguem um trabalho formal, seus salários são menores: entre os homens interiorizados, o salário mensal é de R$ 1.612, enquanto as mulheres recebem apenas R$ 1.177 (quase metade do salário médio pago às brasileiras, de R$2.215 mensais).
“Percebemos que, mesmo com maior escolaridade, a maioria das mulheres que conseguem participar da interiorização o faz pela modalidade de reunificação familiar. A ação que vemos hoje é um dos exemplos do trabalho conjunto que tem sido realizado na região, desde a preparação dessas mulheres para o mercado de trabalho até a mobilização das empresas para que, de fato, ofereçam vagas formais de trabalho para refugiadas e migrantes”, explicou a gerente da ONU Mulheres, Mariana Salvadori. “Quando as mulheres estão economicamente empoderadas, quando elas alcançam a autonomia financeira, elas também se fortalecem contra a violência e o preconceito, além de fazerem girar a economia por meio de emprego e renda. É dever do estado e de toda a sociedade oferecer oportunidades igualitárias para homens e mulheres, considerando as demandas específicas das refugiadas e migrantes, para que elas também tenham oportunidade para se desenvolverem cada vez mais.”
Assista no vídeo a seguir um pouco sobre como foi essa ação: