30 anos da Declaração e Plataforma de Ação de Pequim – Como ela transformou a luta contra a violência de gênero
05.02.2025
Há trinta anos, na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, em 1995, líderes de 189 países e mais de 30.000 ativistas se reuniram para criar um roteiro visionário para alcançar a igualdade de direitos para mulheres e meninas. Esse roteiro, conhecido como Declaração e Plataforma de Ação de Beijing, tornou-se a agenda global mais amplamente respaldada para os direitos das mulheres.
Baseada nas experiências e demandas de mulheres e meninas, a Declaração de Beijing definiu 12 áreas críticas de ação, incluindo a violência contra as mulheres.
À medida que nos aproximamos de seu 30º aniversário, em 2025, a Declaração e Plataforma de Ação de Beijing continua sendo um pilar fundamental no movimento pelos direitos das mulheres e pela igualdade de gênero, com governos, ativistas e a ONU avaliando os avanços, enfrentando desafios e comprometendo recursos para implementar essa agenda.
Descubra como a Declaração e Plataforma de Ação de Beijing transformou a agenda para erradicar a violência contra mulheres e meninas e o que isso significa hoje.
Os direitos das mulheres são direitos humanos: Um marco para a igualdade de gênero
A Conferência Mundial de Direitos Humanos da ONU, realizada em Viena, em 1993, marcou a primeira vez que os direitos das mulheres foram explicitamente reconhecidos como direitos humanos.
“Os direitos humanos são direitos das mulheres, e os direitos das mulheres são direitos humanos” tornou-se um grito de mobilização para as feministas na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, em Beijing. O lema veio de um discurso proferido pela então Primeira-Dama dos Estados Unidos, Hillary Rodham Clinton.
A Plataforma de Ação de Beijing afirmou o direito das mulheres de viverem livres da violência.
A conferência serviu como um palco para que as feministas se organizassem e defendessem a ratificação de outro importante acordo internacional: a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), adotada pela Assembleia Geral da ONU em 1979, e seu Protocolo Facultativo, uma medida finalizada em 1999 que permitiu que indivíduos denunciassem violações diretamente ao Comitê da CEDAW. Isso criou pressão política sobre os governos para abordar a violência contra mulheres e meninas.
Hoje, não há dúvidas de que os direitos das mulheres são direitos humanos, mas com uma em cada três mulheres sofrendo violência ao longo da vida e uma mulher sendo assassinada intencionalmente por um parceiro íntimo ou membro da família a cada 10 minutos, nenhum país cumpriu a promessa de uma vida livre de violência para as mulheres.
Leis sobre violência doméstica: Um impulso pós-Pequim
Em 1994, cerca de 12 países tinham sanções legais contra a violência doméstica.
Após a Declaração e Plataforma de Ação de Beijing, esse número cresceu rapidamente. Hoje, o Banco de Dados Global da ONU Mulheres sobre Violência contra as Mulheres lista 1.583 medidas legislativas em 193 países, incluindo 354 especificamente voltadas para a violência doméstica.
Pesquisas indicam que a adoção de acordos internacionais e regionais de direitos humanos, juntamente com a mobilização social feminista, impulsionou a introdução de leis e políticas progressistas.
Hoje, há amplas evidências de que as leis sobre violência doméstica reduzem a violência por parte de parceiros íntimos. Os países com essas leis registram uma taxa de prevalência de 9,5%, em comparação com 16,1% nos países sem legislação específica. No entanto, a implementação continua sendo um desafio, com lacunas na proteção legal abrangente e nos serviços de apoio às sobreviventes.
Transformando normas sociais e ampliando serviços essenciais para sobreviventes
A Declaração de Beijing foi inovadora ao abordar a violência contra mulheres e meninas de maneira abrangente. Ela exigiu a ampliação do acesso a serviços essenciais, incluindo abrigos, assistência jurídica, atendimento médico e apoio psicológico. Antes de 1995, existiam apenas 19 mecanismos institucionais para a violência doméstica; mais de 95% desses mecanismos foram estabelecidos após a Plataforma de Ação de Beijing.
A Declaração de Beijing também enfatizou a prevenção, instando governos e atores do desenvolvimento internacional a investirem em educação e campanhas de conscientização para desafiar normas sociais e estereótipos que perpetuam a violência contra as mulheres.
Por que os dados sobre violência contra as mulheres são importantes
O que não é contado permanece invisível. Sem dados de qualidade sobre a violência contra mulheres e meninas, políticas e leis não podem abordar adequadamente a realidade que elas enfrentam todos os dias.
Antes de 1995, a maioria dos dados sobre violência contra as mulheres vinha de pequenos estudos pontuais. A Declaração sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres de 1993 já havia instado os governos a coletar dados sobre essa violência, especialmente a violência doméstica. A Declaração e Plataforma de Ação de Beijing também exigiu a coleta sistemática de dados, levando à realização de pesquisas nacionais e estudos internacionais, como o Estudo Multipaíses da OMS sobre Violência Doméstica.
Entre 1995 e 2014, 102 países realizaram pesquisas nacionais sobre violência contra as mulheres.
Hoje, temos iniciativas globais como o programa Women Count da ONU Mulheres e o Banco de Dados Global sobre Violência contra as Mulheres, que monitoram o progresso e destacam áreas que precisam de ação urgente. Desde sua criação, em 2016, o programa Women Count tem apoiado países na coleta de mais dados sobre violência contra as mulheres e liderado a criação de um marco para medir a violência facilitada por tecnologia.
O poder dos movimentos feministas e das organizações de mulheres
A Plataforma de Ação de Beijing reconheceu a força dos movimentos feministas e da sociedade civil na formulação de políticas e no apoio às sobreviventes. Pesquisas confirmam que a presença de um movimento feminista forte e autônomo é o fator mais decisivo para impulsionar mudanças e acabar com a violência contra mulheres e meninas.
Ainda assim, em 2022, os países destinaram menos de 1% da ajuda ao desenvolvimento para combater a violência baseada em gênero, e apenas uma fração desse valor chegou às organizações de mulheres.
O Fundo Fiduciário da ONU para Acabar com a Violência contra as Mulheres, gerido pela ONU Mulheres em nome do sistema da ONU, é o único mecanismo global de financiamento dedicado exclusivamente a iniciativas para erradicar todas as formas de violência contra mulheres e meninas. Em 1996, a resolução 50/166 da Assembleia Geral da ONU pediu a criação do Fundo Fiduciário da ONU em conformidade com as medidas estabelecidas na Declaração e Plataforma de Ação de Beijing. Até hoje, o Fundo já concedeu 225 milhões de dólares a 670 iniciativas em 140 países e territórios.
Além disso, a Coalizão de Ação para o Fim da Violência Baseada em Gênero, parte da iniciativa Geração Igualdade, está trabalhando para aumentar em 500 milhões de dólares o financiamento nacional para organizações de direitos das mulheres e lideradas por meninas até 2026. Isso já resultou em compromissos inovadores, como o novo programa ACT da ONU Mulheres para erradicar a violência contra as mulheres, financiado por um investimento de 22 milhões de euros da União Europeia no fortalecimento dos movimentos de direitos das mulheres e suas ações de advocacy.
Defendendo os direitos das meninas: ontem e hoje
A Declaração e Plataforma de Ação de Beijing foi o primeiro documento global de políticas sobre mulheres a incluir um foco específico nos direitos das meninas e abordar a violência contra elas.
O documento pediu que os governos ratificassem a Convenção sobre os Direitos da Criança, garantissem o registro de nascimento e a identidade nacional para meninas e ampliassem seu acesso à educação e à formação em Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM). Também definiu ações para protegê-las contra a violência de gênero, incluindo práticas como casamento infantil, mutilação genital feminina e gravidez na adolescência — problemas que ainda restringem os direitos, a saúde e o bem-estar das meninas hoje.
Embora avanços tenham sido alcançados, novos desafios, como as mudanças climáticas e o assédio online, estão agravando a violência contra meninas, conforme revela o último relatório do Secretário-Geral da ONU.
Com nove milhões de meninas em risco de serem forçadas ao casamento infantil até 2030 e uma em cada quatro adolescentes sofrendo abuso por parte de um parceiro até os 19 anos, a Plataforma de Ação de Beijing continua sendo um plano essencial para proteger os direitos das meninas e garantir que suas vozes sejam ouvidas