Direitos humanos das mulheres quilombolas
15.06.2023
As mulheres quilombolas desempenham um papel fundamental na proteção ambiental e na resposta às mudanças climáticas devido ao seu conhecimento local e liderança na gestão sustentável dos recursos e na condução de práticas sustentáveis nos níveis doméstico e comunitário. No entanto, as suas necessidades e prioridades diferenciadas, relacionadas com o seu desenvolvimento e realização dos direitos humanos, raramente são integradas no planejamento federal, estatal ou municipal apoiado pelos orçamentos.
Elas se organizam para a mobilização social e defendem o respeito, a proteção e a realização dos direitos humanos. Os enfrentamentos aos riscos e impactos das alterações climáticas, que afetam as suas oportunidades sociais e econômicas, assim como os seus meios de subsistência, são constantes. Sem acesso e participação em fóruns formais de tomada de decisão e constantemente confrontadas com ataques violentos, as mulheres quilombolas no Brasil fortalecem o ativismo por meio de iniciativas de defesa, mídias tradicionais e sociais.
As mulheres quilombolas enfrentam múltiplas formas de discriminação e estão expostas às várias formas de violência. Elas são as principais impactadas pelos conflitos territoriais, pelos empreendimentos desenvolvimentistas e pela supressão de direitos, o que compromete significativamente o desenvolvimento social e econômico dessas mulheres. Mesmo nesse cenário adverso, as comunidades resistem e a mobilização dessas mulheres tem ganhado cada vez mais espaço, afirmando sua importância e a defesa dos direitos dos seus povos e seus territórios.
A lacuna de participação das mulheres quilombolas nos processos de tomada de decisão e nos mercados de trabalho, devido às desigualdades existentes, impede-as de contribuírem plenamente para os processos de governança, planejamento, elaboração e implementação de políticas relacionadas com o meio ambiente.
Mecanismos internacionais de direitos humanos
Embora a Constituição brasileira e a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) protejam todas as mulheres contra a discriminação, na prática, no Brasil, as mulheres e quilombolas, que enfrentam múltiplas formas de discriminação, muitas vezes não são beneficiárias pelas políticas em sua integridade das medidas tomadas pelos governos federal e estadual e pelas autoridades municipais.
Nos seus esforços para cumprir as obrigações do Estado no âmbito da CEDAW, e dos outros tratados e compromissos internacionais de direitos humanos – como a Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (CERD), a Convenção 169 e o Plano de Ação de Durban – as autoridades nacionais muitas vezes não conseguem compreender e responder as questões emergentes de direitos humanos e as formas específicas em que as mulheres quilombolas são vulneráveis a violações de direitos humanos ou a políticas e legislação que não respondem à igualdade de gênero.
Além da CEDAW, em 2022, o Brasil passou pela revisão do Comitê da ONU para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial – o Comitê CERD. Ele é o órgão responsável, entre outras coisas, por monitorar a implementação da CERD.
Uma das recomendações feitas pelo Comitê ao Brasil foi que o Estado Parte tome todas as medidas eficazes para aumentar substancialmente os níveis de representação política entre mulheres e homens quilombolas, incluindo tomar ação imediata para prevenir e responder a todas as formas de violência contra as mulheres Afro-brasileiras concorrendo ou titulares de mandatos públicos, incluindo aquelas que se identificam como LGBTQIA+, responsabilizando os perpetradores e fornecendo reparações às vítimas [1] .
As recomendações do Comitê CERD devem ser implementadas durante os próximos quatro anos. O Estado deve apresentar ao Comitê um informe atualizando sobre o progresso na implementação dessas recomendações no período de um ano.
Fortalecimento de políticas, planos e orçamentos
As pessoas ativistas das comunidades quilombolas assinalam continuamente os impactos negativos das políticas e da legislação ambiental, que não foram consultadas, nas suas vidas. Portanto, com base nas experiências anteriores e atuais, a ONU Mulheres tem trabalhado no estabelecimento de plataformas para que as mulheres quilombolas se envolvam significativamente nas políticas públicas, a nível federal, estadual e municipal, a participação igual na política e em espaços de liderança.
Por meio de um de seus projetos, – “Conectando Mulheres, Defendendo Direitos” visa possibilitar melhores condições de atuação para as defensoras, fortalecendo a solidariedade, as habilidades e a comunicação para alertas precoces e autoproteção contra ameaças e violência. A iniciativa tem, ainda, foco especial nas mulheres indígenas e quilombolas. Uma das onze organizações de defensoras de direitos humanos participantes do projeto é o Coletivo de Mulheres da CONAQ, a mais proeminente articulação de mulheres quilombolas com capilaridade e representatividade nacional, que defende os direitos humanos das mulheres quilombolas. O projeto “Conectando Mulheres, Defendendo Direitos” tem contribuído para fortalecer as capacidades institucionais de articulação e comunicação para a construção do II Encontro Nacional de Mulheres da CONAQ em Brasília, DF.
Com o objetivo de buscar caminhos para eliminar a discriminação contra as mulheres indígenas e quilombolas no Brasil, a ONU Mulheres e a Embaixada da Noruega lançaram em janeiro de 2021 o projeto “Direitos humanos das mulheres indígenas e quilombolas: uma questão de governança!”. A iniciativa se dedica a contribuir com o fortalecimento de políticas, planos e orçamentos que atendam às necessidades e prioridades dessas mulheres nos estados do Maranhão e Pará e quatro municípios: Grajaú (MA), Penalva (MA), Mocajuba (PA) e Santa Luzia do Pará (PA).
A ONU Mulheres busca, com este projeto, promover os direitos humanos das mulheres indígenas e quilombolas no Brasil, avançando na implementação das recomendações emitidas pela Relatora Especial sobre os direitos dos povos indígenas em sua missão no Brasil; bem como no 3º ciclo da Revisão Periódica Universal (RPU) no Brasil; e na Recomendação Geral n. 39 do Comitê da Convenção da ONU para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), marco normativo que busca aperfeiçoar e aprofundar a interpretação da extensão dos direitos reconhecidos na CEDAW às mulheres e meninas indígenas.
[1] (CERD/C/BRA/CO/18-20, para. 26, (c) – Tradução livre)