Rede de atendimento e orçamento para políticas são principais desafios para enfrentamento à violência de gênero
13.12.2017
Participantes chamaram a atenção também para as propostas de mudanças legislativas, em discussão no país
O PNUD e a ONU Mulheres acabam de lançar no Brasil o relatório “Do Compromisso à Ação: Políticas para Erradicar a Violência contra as Mulheres na América Latina e no Caribe”. O documento reforça o que especialistas em gênero vêm afirmando: a região é a mais violenta do mundo para as mulheres, apesar de suas políticas nacionais de proteção. No Brasil, não é diferente, concluem representantes de mais de dez organizações brasileiras de direitos das mulheres e de organismos internacionais, como PNUD e ONU Mulheres, presentes no debate de lançamento realizado na Casa da ONU, em Brasília, na semana passada.
De acordo com o relatório:
• América Latina e Caribe têm as taxas mais altas do mundo em violência contra as mulheres fora do espaço doméstico e a segunda mais alta de violência doméstica.
• Em 15 países do Caribe, em 2014, 1678 mulheres foram assassinadas.
• No mundo, 35% das mulheres são vítimas de algum tipo de violência.
• 38% do total de homicídios se deve à violência conjugal.
• 24 dos 33 (72%) países da região executaram políticas ou planos de trabalho, dos quais 9 eram específicos para a erradicação da violência contra as mulheres.
• 31 dos 33 (94%) países da região contam com planos de ação nacional para eliminar a violência contra as mulheres e ou de gênero. Desses, 15 são específicos para a violência contra as mulheres.
• A distância entre a realidade da violência contra as mulheres e as leis para abordá-la é crítica. Em alguns países, é necessário aprofundar a legislação para reduzir essas distâncias. Assim, a qualidade das respostas para erradicar a violência contra as mulheres e os serviços de atenção às vítimas serão adequados e relevantes.
“Estamos aqui para aprofundar a análise do contexto do relatório”, explicou a representante da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman, na abertura do lançamento. Logo depois, especialistas das duas agências da ONU e integrantes do consórcio de organizações que elaborou a Lei Maria da Penha discutiram as principais recomendações do relatório à luz da atualização dos dados desde 2015. Algumas mudanças, por exemplo, dizem respeito ao tamanho da rede de atendimento a mulheres vítimas de violência e também ao orçamento público destinado ao enfrentamento à violência.
Presente no debate, a assessora técnica do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) Carmela Zigoni mostrou a queda dos recursos destinados ao combate à violência contra as mulheres no orçamento federal. De 2014 a 2016, registrou-se redução de 40% no volume de recursos do programa. Para 2017, foi de 52% em comparação ao ano anterior. “Para 2018, a expectativa é uma redução ainda maior. Chega a 74%”, revela.
Para as especialistas presentes, outro desafio importante diz respeito ao modo como o sistema de Justiça vem desenvolvendo respostas sobre o tema da violência contra as mulheres. Uma delas diz respeito à adoção de práticas, como a constelações familiares, em lugar da aplicação da Lei Maria da Penha. Entre as decisões já anunciadas estão a elaboração de uma análise sobre o tema.
Compromisso – Nadine Gasman destacou o marco dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência pelas Mulheres, que teve início no último dia 20 de novembro e terminou em 10 de dezembro; a pesquisa Condições Socioeconômicas e Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, que retratou a realidade de 10 mil mulheres, entre 15 e 50 anos, moradoras de nove capitais nordestinas (Aracaju, Fortaleza, João Pessoa, Maceió, Natal, Recife, Salvador, São Luís e Teresina), e apontou, entre outros fatos, que 17% das mulheres no Nordeste sofreram violência física ao menos uma vez na vida; e o impacto do aprofundamento da crise político-econômica na prevenção e no enfrentamento da violência contra as mulheres no Brasil. As participantes chamaram a atenção também para as propostas de mudanças legislativas, em discussão no país.
O diretor de país do PNUD, Didier Trebucq, ressaltou que, apesar dos avanços recentes, “ainda há muito a se fazer”, quando se trata do enfrentamento da violência contra as mulheres. Lembrou a importância “de os homens também se comprometerem com a causa” e o fato de o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 (Igualdade de Gênero) ser transversal e, por isso, ter impacto em diversos ODS, entre eles a erradicação da pobreza. Trebucq citou dados de impacto, como o de que os 5 países mais violentos do mundo estão na América Latina, e 15 já tipificam o crime de feminicídio na região. “O PNUD está institucionalmente comprometido com a questão”, afirmou ao destacar o plano de trabalho do PNUD para o Brasil, que tem a igualdade de gênero e raça entre suas prioridades.