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A ONU Mulheres é a organização das Nações Unidas dedicada à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres.

Brasil

Por mais mulheres nas engenharias, ciências e tecnologias, artigo da ONU Mulheres, Fundo Elas, Fundação Carlos Chagas e Instituto Unibanco



15.03.2018


Artigo publicado no jornal O Globo por ocasião da realização do Seminário Elas nas Exatas, publicado em 15 de março de 2018

Por autoria coletiva

“A educação é a arma mais poderosa para vencermos os obstáculos”. A frase é da química Joana D’Arc Félix, recente vencedora do Prêmio Faz a Diferença, do Jornal O Globo. Mulher negra, filha de trabalhadora doméstica, Joana teve muito apoio da família e de professores para estudar, ingressar na Unicamp e na Universidade de Harvard e seguir uma carreira de sucesso como cientista.

A inspiradora história de Joana D’Arc se insere em um contexto mais amplo de conquistas das mulheres, que ao longo do século XX lutaram por educação e alcançaram mais tempo de estudos, ocupando o ensino superior e a pós-graduação, onde são maioria hoje. É esse avanço coletivo que propiciou o surgimento de iniciativas atuais como PretaLab, MariaLab e outros coletivos de jovens mulheres que estimulam outras mulheres a se apropriarem dos saberes das áreas exatas e tecnológicas e as fortalecem para enfrentar o machismo e o racismo ainda marcante nessas áreas.

Mesmo com essas conquistas, Joana D’Arc e outras importantes cientistas são as exceções que confirmam a regra: as mulheres, sobretudo as negras, ainda são minoria nas engenharias, ciências e tecnologias, profissões e carreiras com melhor remuneração e prestígio no Brasil. Em 2016 as mulheres representavam quase metade dos aprovados na Fuvest (vestibular que seleciona alunos para a Universidade de São Paulo), no entanto, eram apenas 1 em cada 5 estudantes dos cursos de ciências exatas. Apenas 18% dos calouros da Escola Politécnica da USP de 2016 eram mulheres e 23% na Faculdade de Física. De acordo com o Censo da Educação Superior de 2016, 82,1% dos cursistas de enfermagem no país são mulheres, enquanto em Ciências da Computação elas somam apenas 13,3%.

Essa exclusão das mulheres do campo das ciências exatas e tecnologias começa cedo, na infância e no ambiente escolar. A socialização das meninas na família e na escola é fortemente orientada pelos papeis tradicionais de gênero, que contribuem para manter as mulheres em posições desprestigiadas (e subalternizadas) na sociedade e os homens, ao contrário, em posições privilegiadas de poder. A ideia de que existem brincadeiras “de menina” e “de menino”, ainda muito comum, é um exemplo disso. Essa pressão social impede o desenvolvimento pleno das meninas, desestimulando-as e, pior, restringindo o seu horizonte de possibilidades pessoais e profissionais.

Apesar de abandonarem menos a escola e terem médias melhores, as meninas não são estimuladas a serem engenheiras e cientistas. Enquanto no 5º ano do Fundamental a diferença de desempenho em Matemática entre meninos e meninas é de só 1,8 ponto percentual, ela aumenta para 5,2 pontos no 3º ano do Ensino Médio (Todos pela Educação, 2015). Esses dados demonstram que, embora o desempenho das meninas seja similar ao dos meninos no início da trajetória escolar, ao longo do ciclo as meninas vão apresentando notas piores. Pesquisas indicam que esse desequilíbrio é em grande parte resultado de discriminações, veladas ou não, que reforçam estereótipos que desestimulam e afastam as meninas da Matemática.

Mais do que nunca, precisamos fortalecer o debate sobre direitos das mulheres e incidir na educação, particularmente nas escolas, como estratégia fundamental para transformar essa realidade, para que as meninas possam ampliar seu horizonte de escolhas e terem as mesmas oportunidades que os meninos.

Para isso, é imprescindível que os profissionais da educação – diretores e professores – atuem para desconstruir estigmas sociais e quebrar as dinâmicas que permeiam as desigualdades entre homens e mulheres. Sabemos que nem sempre a escola está preparada para lidar com estas questões. Por isso, é valiosa a parceria das escolas com organizações feministas da sociedade civil e universidades para, juntos, enfrentarem o desafio de promover a equidade de gênero na educação.

A escola deve romper com os padrões de desigualdade, em vez de reproduzi-los. É para transformar essa realidade que nós que assinamos este artigo nos unimos em uma aliança inovadora para fomentar práticas de gestão escolar e pedagógicas que busquem quebrar estigmas e promover equidade em favor das jovens no Ensino Médio, ampliando suas possibilidades de realizar quaisquer escolhas, inclusive no campo das exatas.

*Amalia Fischer (Fundo ELAS); Nadine Gasman (ONU Mulheres Brasil); Ricardo Henriques (Instituto Unibanco) e Sandra Unbehaum (Fundação Carlos Chagas). As quatro instituições se uniram e lançaram o Edital Gestão Escolar para Equidade: Elas nas Exatas, que em 2017 chegou à segunda edição. A iniciativa já apoiou 20 projetos nas cinco regiões do país.