Mulheres indígenas buscam apoio da ONU Brasil para encontro Aty Guasu e em defesa de terras tradicionais
17.08.2017
Grande assembleia de mulheres indígenas Guarani-Kaiowás acontecerá de 18 a 22 de setembro, no Mato Grosso do Sul. Comitiva de lideranças indígenas foi recebida por dirigentes e corpo técnico das Nações Unidas
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“Qual o significado da Declaração Universal de Direitos Humanos para vocês? ”, indagou Clara Almeida, indígena do povo Guarani-Kaiowá, às dirigentes e ao corpo técnico da ONU Brasil em reunião realizada na última segunda-feira (14/8), em Brasília. Com uma fala emocionada diante das violências e das perseguições contra os povos indígenas, Clara Almeida descreveu o drama que vivem devido aos conflitos territoriais e discriminação. O grupo está na capital federal como parte da mobilização de povos indígenas e quilombolas sobre julgamento referente à demarcação de terras tradicionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o qual foi adiado na quarta-feira (16/8) sem data prevista.
“Toda a vez que a gente derrama uma lágrima, é de dor. A gente está aqui de novo, a gente está aqui se humilhando e fazendo rolar a lágrima que ainda existe. Quando a gente sai em luta em defesa das nossas terras, a gente leva bala e gás de pimenta. Coloquem-se no nosso lugar. Se vocês não fizerem nada por nós, seremos peças de museu. É isso o que vai acontecer”, frisou Clara em alusão à extinção dos povos indígenas.
Rezadeira do povo Guarani-Ñandeva, Leila Lopes relatou o esgotamento de negociações com o poder público e conclamou o apoio das Nações Unidas para o cumprimento dos compromissos do Estado brasileiro assumidos através Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas, a qual completará dez anos no próximo mês. “A gente não tem mais onde reclamar nem para quem denunciar. Nosso socorro precisa vir de vocês. Nós precisamos ser vistos como seres humanos. Nós somos os povos originários do Brasil. A nossa raiz é a terra. Sem a raiz, o galho e a folha também vão cair. É por isso que estamos aqui pedindo socorro”, frisou.
Fome, miséria, violência, feminicídio, homicídios, desaparecimento de corpos e perseguição foram destacados como problemas crônicos e que violam os direitos dos povos indígenas, comprometendo o ordenamento jurídico brasileiro e as normativas internacionais. “Eu tenho força nas pernas e na voz para transmitir a dor dos nossos povos. Nós somos ameaçadas e criminalizadas. Queremos que vocês conheçam a nossa tekoha (terra) e conheçam a nossa realidade”, completou Leila Lopes.
Aty Kuña – A delegação indígena também apresentou para a ONU o calendário de mobilização das mulheres, para fortalecer a sua articulação política. “Hoje, viemos aqui para solicitar o apoio para a assembleia de mulheres Guarani-Kaiowás. As mulheres estão bebendo água envenenada. Para cada mãe ou pai ameaçados, um filho também sofre ameaça. Na grande assembleia de mulheres, é onde a gente discute as nossas questões”, disse Flávia Nunes. O encontro é chamado em Guarani como Aty Kuña (grande encontro de mulheres) e acontecerá de 18 a 22 de setembro, na aldeia Kuruçu Amambá, município de Coronel Sapucaia, em Mato Grosso do Sul, na divisa do Brasil com o Paraguai.
Voz das Mulheres Indígenas – Integrante do Grupo Assessor da Sociedade Civil da ONU Mulheres Brasil, Jaqueline Porto solicitou a continuidade do projeto Voz das Mulheres Indígenas, desenvolvido pela entidade entre 2015 e 2017, para seguimento do apoio à articulação e incidência política. “Queremos que o programa seja trazido de volta e aplicado em áreas de retomada, a exemplo de Mato Grosso do Sul. Pelo menos, alguém vai estar nos ouvindo e apoiando a capacitação de lideranças e no enfrentamento à violência contra as mulheres indígenas”, demandou Jaqueline.
A ativista salientou as mulheres indígenas estão sendo expulsas das suas terras em meio as sucessivas ameaças. “Nós não conseguimos voltar para as nossas casas, porque estamos sendo perseguidas”, adicionou ao mencionar que ela mesma vive essa situação.
A coordenadora-residente interina da ONU e representante do Alto Comissariado da ONU para Refugiados, Isabel Marques, declarou o apoio das Nações Unidas no Brasil aos povos indígenas. “Fiquem com a mensagem de que estamos juntas. Nosso trabalho é dar apoio a vocês dentro e fora do Brasil”, disse.
A representante da ONU Mulheres Brasil e coordenadora do Grupo Temático de Gênero, Raça e Etnia da ONU Brasil, Nadine Gasman, confirmou o apoio da ONU Mulheres ao Aty Kuña, a disposição de aprofundar o trabalho com as mulheres indígenas e o interesse de elaborar um plano de emergência frente ao agravamento da situação relatada pelas lideranças indígenas. “Vocês são guerreiras. Um povo que tem mulheres como vocês é um povo imbatível. Que vocês passem para a história como as pessoas que fizeram acontecer”, afirmou Nadine Gasman.