Confira algumas histórias de mulheres indígenas do Brasil no Dia Internacional dos Povos Indígenas do Mundo
09.08.2016
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O tema central deste ano para o Dia Internacional dos Povos Indígenas do Mundo, que se celebra neste 9 de agosto, é direito à educação. O direito dos povos indígenas à educação está protegido pela Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e outros instrumentos de direitos humanos, entre eles a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, adotada por líderes mundiais em setembro de 2015, e o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 4 fortalecem esse direito com um chamado à eliminação das dispariedades de gênero na educação e ao acesso igualitário – que compreenda os povos indígenas – em todos os níveis da educação e da capacitação profissional.
Hoje, o direito à educação está longe de ser uma realidade plena e concreta para os povos indígenas do mundo. Em todas as regiões, persistem as disparidades entre as populações indígenas e as não indígenas quanto ao acesso à educação, à retenção escolar e ao nível de avanço. A lacuna é mais profunda no caso das mulheres e meninas indígenas, condenadas assim a um ciclo de pobreza, menos oportunidades, pior saúde e falta de condições para a tomada de decisões.
A ONU Mulheres trabalha com mulheres indígenas de todo o mundo, promovendo seus direitos e fazendo ouvir a sua voz. Estima-se que, das 370 milhões de pessoas indígenas do mundo, 45 milhões vivam na América Latina e Caribe, representando 8,3% da população na região [1]. Em média, 85% das meninas e meninos indígenas estejam na escola secundária, porém somente 40% concluem [2]. Neste Dia Internacional dos Povos Indígenas do Mundo, a ONU Mulheres destaca o seu trabalho com as mulheres indígenas.
“Minha vida inteira morei na aldeia. Saí de lá para fazer a faculdade de Secretariado Executivo Bilíngue Português-Inglês na Universidade Estadual de Londrina. Passei nove anos lá. A faculdade não ensinou, ela aprimorou. Procuro ajudar o meu povo. Sou aquela que busca informação para quem não saiu da base”, apresenta-se. Os olhos de Andreia marejam quando ela lembra a colaboração de professoras e professores na validação de trabalhos sobre o seu povo, tarefa que, por vezes, compensava a ausência em aula em dia de reunião. “Tive filho no primeiro ano de faculdade. Costumo dizer que o curso foi o pai do meu filho, já que sou mãe solteira”, acrescenta. Os estudos também fizeram companhia na busca de Andreia sobre a história de seu povo além das fronteiras da aldeia Laranjinha, onde vivem 250 indígenas, nas imediações do município de Tomazina.Saiba mais: “Enquanto eu não ver cada mulher falando por si, minha luta não acabou”, afirma a guarani nhandeva Andreia Lourenço Na divisa entre Alagoas e Sergipe, os Wassu Cocal teriam se fixado na região, no século 19, após a vitória da Tríplice Aliança – Brasil, Argentina e Uruguai – contra o Paraguai na disputa pelas terras do Mato Grosso. “A luta do meu povo começou desde a Guerra do Paraguai. Os guerreiros receberam as terras do imperador. O povo Wassu passou 10 anos lá. Depois desse período, os fazendeiros tomaram as terras. Muito massacre, negação de origem para não morrer. Espalharam-se e foram para as cidades. Há 30 anos, as pessoas estão retornando para exigir as suas terras”, relembra Iara Wassu Cocal, integrante da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Espírito Santo e Minas Gerais.
Leia: “Quando a gente pega o sabor da luta, a gente não quer parar mais”, afirma Iara Wassu Cocal “A gente já vem de uma família de liderança. Meus avós por parte de pai e de mãe sempre foram caciques. Isso é uma questão histórica, vem de sangue, vem de família. Liderança já nasce liderança. Não se faz liderança de hoje para amanhã. É só esperar o tempo dela”, afirma Simone Eloy Amado. Ela é uma dos 16 mil terenas e multiplicadora do projeto A Voz das Mulheres Indígenas. Divide o seu tempo entre dois mundos: o tradicional e o acadêmico. Simone concilia a vida na aldeia Ipegui, no município sul-matogrossense de Aquidauana, com a vida no campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde cursa o mestrado em Antropologia Social do Museu Nacional. O tempo é de colheita na vida de Simone. Em fevereiro de 2016, ela defenderá a sua dissertação e já faz planos para o futuro: doutorado sobre as mulheres indígenas. “No momento em que você entra na universidade, você não está estudando somente para si. Você está estudando para um povo”, sentencia.
Continue lendo: Entre a aldeia e a universidade, a terena Simone Amado é uma das articuladoras políticas indígenas no Centro-Oeste No seu sobrenome, Maria Leonice Tupari carrega a sua etnicidade. Seus antepassados e antepassadas foram forçadas a migrar do Mato Grosso para Rondônia, como resultado da escravização por seringueiros. É com os olhos marejados e a voz entrecortada que Maria relembra histórias de vida marcadas pela violência num tempo que as “mulheres indígenas eram dadas” e seu povo era alvo da expropriação cultural que lhes impedia de falar a língua materna. Aos 39 anos e mãe de quatro filhas e um filho, Maria Leonice Tupari é da Terra Indígena Rio Branco, cortada pelo Rio Branco e Rio Guaporé, do município Alta Floresta do Oeste. Num território demarcado e homologado, convive com nove povos: Arua, Makurap, Kampé, Tupari, Dihoi, Jabuti, Sakirabia, Kanoê, Arikapú. Atualmente, vive na tribo indígena Sete de Setembro, habitada pelos Paiter Suruí, no município de Cacoal. Desde junho de 2015, Leonice é uma das multiplicadoras do projeto Voz das Mulheres Indígenas, o qual tem proporcionado o fortalecimento da consciência delas sobre a sua organização política.Mulheres indígenas estão na luta pela terra e sofrem ameaças de madereiros Uma das principais lideranças do projeto Voz das Mulheres Indígenas é Sônia Guajajara, integrante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Ela explica que o projeto Voz das Mulheres Indígenas tem colaborado para “tentar unificar uma pauta, trazer as mulheres não fisicamente, mas com suas ideias e demandas. A gente tem isso para definir qual a pauta comum das mulheres indígenas brasileiras, tentando alcançar a diversidade étnica e cultural no sentido de ver qual é a nossa demanda e como podemos atuar com maior participação e incidência das mulheres em todos os processos de decisão e discussão”. Sônia é da povo Tenetehara e nascida no Maranhão. Dentre as demandas políticas dos povos indígenas no país, ela destaca a garantia de direitos para “não permitir o retrocesso dos direitos adquiridos na Constituição Federal. A principal luta continua sendo a garantia do território, porque a partir daí a gente consegue garantir as outras políticas sociais, culturais e políticas para as mulheres. A gente não tem saúde diferenciada para as mulheres indígenas. Há especificidades que precisam ser atendidas”.
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